Transação tributária - MP do Contribuinte Legal.

Transação Tributária - MP do Contribuinte Legal

Foi publicada a Portaria 11.956, que regulamenta parte da transação tributária prevista na Medida Provisória (MP) 899/2019, batizada pelo governo de MP do Contribuinte Legal. Em entrevista coletiva, os integrantes da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirmaram que devido o intervalo entre a publicação da MP e da portaria, o Executivo diminuiu as previsões de resgate de dívida de R$ 1,4 bilhão para cerca de R$ 460 milhões este ano. Para 2020, a expectativa de arrecadação com a MP é de R$ 6,4 bilhões. 

O texto, redigido pela PGFN, regulamenta a transação, ou seja, a possibilidade de pagamento dos débitos de forma parcelada e com descontos, em três situações: negociação proposta pela PGFN, negociação proposta pelo devedor e adesão a edital divulgado pela PGFN. Segundo o Ministério da Economia, o primeiro edital será publicado na primeira semana de dezembro.

De acordo com a portaria, que ficará disponível para consulta pública até fevereiro de 2020, os contribuintes com débitos tributários federais de até 15 milhões podem negociar suas dívidas ou aderir a editais. Nos casos de débitos superiores a esse valor apenas a transação individual está disponível. Segundo informações da PGFN, 1,13% dos contribuintes inscritos em dívida ativa devem mais de R$ 15 milhões aos cofres públicos. Assim, a maioria esmagadora dos contribuintes podem aderir aos editais. 

Além disso, outro destaque é o uso de precatórios, tema que não consta na MP, apenas na regulamentação. A portaria possibilita o pagamento de débitos por meio de precatórios federais dos próprios devedores ou de terceiros. 

A possibilidade de realização de transações tributárias, prevista no Código Tributário Nacional (CTN) desde 1966, é vista com bons olhos para especialistas consultados pelo JOTA. “O Brasil tem um passivo tributário considerável, a estimativa são R$ 3 trilhões, contando as três esferas: União, estados e municípios, ou seja, metade do PIB brasileiro.”, calcula Vitória Cordeiro, advogada do escritório Urbano Vitalino Advogados. “Eu entendo que essa medida do governo federal veio proporcionar uma condição para aquelas empresas identificadas como contribuintes legais. Não é para beneficiar os grandes devedores, nem os devedores contumazes”, complementa.

C ou D

Assinada em outubro, a MP do Contribuinte Legal concede descontos de até 50% a dívidas classificadas como C ou D no rating da Dívida Ativa da União, que são débitos de difícil recuperação. O percentual de desconto pode chegar a 70% no caso de pessoas físicas, micro e pequenas empresas. Além disso, é permitido o pagamento dos débitos em até 84 meses. Pessoas físicas, micro e pequenas empresas poderão dividir os débitos em até 100 meses.

Segundo a PGFN, para medir o que é um crédito de difícil recuperação, a União vai levar em consideração a verificação das informações cadastrais, patrimoniais ou econômico-fiscais prestadas pelo próprio devedor ou por terceiros à PGFN ou aos demais órgãos da Administração Pública. O devedor deve ter conhecimento da sua capacidade de pagamento e poderá apresentar pedido de revisão caso discorde das conclusões da PGFN.

A MP e a portaria não se aplicam a débitos do Simples Nacional, FGTS, multas qualificadas e multas criminais. As regras também não são válidas para discussões que estão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Ainda, a MP abrange apenas tributos federais, como PIS, Cofins, IPI, Contribuição Previdenciária, Imposto de Renda, CSLL e Imposto de Importação.

Podem aderir à transação por adesão, entre outros, devedores com dívidas ativas de débitos inscritos há mais de 15 anos e sem anotação de garantia ou suspensão de exigibilidade, débitos suspensos por decisão judicial há mais de 10 anos e devedores com capacidade de pagamento insuficiente.

Já a transação individual pode ser feita por grandes devedores – dívidas acima de R$ 15 milhões – com capacidade de pagamento insuficiente, devedor falido, em processo de recuperação, entes públicos e dívidas suspensas por decisão judicial de valor superior a R$ 1 milhão e com garantias.

A PGFN informou que publicará as condições e os valores de todas as transações firmadas. Todavia, informações protegidas por sigilo fiscal do serão preservadas.

Precatórios

Na análise de especialistas ouvidos pelo JOTA, uma das principais novidades trazidas pela portaria foi o uso dos precatórios próprios e de terceiros para o pagamento de dívidas. De acordo com a portaria, os contribuintes poderão quitar dívidas ativas com a União usando valores que têm a receber do Estado a título de precatórios.

“Antes da MP e da portaria existia uma situação absurda do contribuinte, por vezes, ter crédito com o governo em precatórios, ter débitos e não pode cruzar um com o outro. Só podia fazer a utilização de precatórios a fim de compensação, mas também com alto índice de problemas”, explica o tributarista Leandro Cabral.

“A compensação de precatórios foi declarada inconstitucional pelo STF. O procedimento que a portaria encontrou para fazer o ajuste de contas, é, de fato, liquidação de saldo devedor com base no precatório depositado. Por que isso foi feito assim? Porque a gente tem que preservar as repartições constitucionais dos ingressos da dívida ativa”, informou Daniel de Sabóia, assessor jurídico da PGFN.

O advogado Breno Vasconcelos, do Mannrich e Vasconcelos Advogados, lembra que na esfera federal não se vê a morosidade de pagamento de precatórios como ocorre em alguns estados. “Desde que haja fiscalização e controle [do uso dos precatórios], sou super favorável”, afirma.

O advogado, porém, questiona o fato de a portaria não trazer um prazo para análise dos pedidos de negociação. Isso porque o artigo 9º da norma define que até que a transação seja aceita os débitos não estão suspensos. “Onde está segurança de que, ao aceitar ingressar, [o contribuinte] não vai sofrer uma avalanche de cobrança e ficar indefinidamente sem uma resposta do Estado?”, questiona.

Consulta pública

Outro ponto que recebeu elogios de advogados é o fato de a PGFN ter aberto uma consulta pública para discutir a regulamentação. As sugestões podem ser enviadas entre 2 de janeiro e 28 de fevereiro de 2020. “É uma postura muito aberta ao diálogo”, destaca a advogada Carla Mendes Novo, também do Mannrich e Vasconcelos Advogados.

“Nós optamos pela consulta pública no mesmo dia da publicação da portaria porque não haveria tempo. A forma de compatibilizar foi fazer os dois atos concomitantes”, explicou Cristiano de Morais, procurador-geral de gestão da dívida ativa da União e do FGTS.

Apesar dos elogios, porém, advogados criticam o fato de a transação ter vindo por meio de um medida provisória, que pode não ser transformada em lei pelo Congresso Nacional. Dessa forma, ainda há receio quanto à segurança jurídica da norma, que pode ser efetiva pelo prazo de vigência da MP e, depois, perder a eficácia.

Para o Ministério da Economia, porém, a preocupação não é válida, uma vez que a vigência da MP é imediata. “A MP pode ser alterada ou sequer aprovada porque o Congresso é soberano. Nosso esforço é para que ela seja convertida em lei da maneira como está hoje”, afirmou João Grognet, coordenador-geral de estratégias de recuperação de créditos da PGFN. O Procurador-Geral Adjunto de Gestão da Dívida Ativa da União e FGTS, Cristiano Neuenschwander Lins De Morais, destacou ainda que, caso a MP caduque ou sofra alterações, as relações constituídas no período da vigência da MP permanecem válidas, a não ser que o Congresso edite uma outra resolução dizendo o contrário (Fonte: JOTA)